Democracia on line e OG

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As recentes manifestações de rua não param de provar ao brasileiro certas mudanças importantes no cenário da cidadania.  Em uma análise resumida provaram 4 coisas.
Talvez nem se precise de modelos caríssimos e complexos como o recall, em que na metade do mandato o povo opina se quer que o político continue ou não. “Bastam a internet e as ruas”.1) uma certeza de que reclamar em grupo funciona. Obtêm-se mudanças políticas e sociais do poder público. 2) uma certeza de que o Estado e seus agentes, sempre tão formais, burocráticos e escapistas podem resolver coisas. E o fazem rapidamente quando confrontados pelas ruas. 3) a certeza de vitória ligada a um povo invariavelmente acostumado a mesmices em relação ao Estado e a governos. O povo paga a conta e ouve apenas promessas por décadas, em épocas de eleição. 4) a certeza de que redes sociais na Internet são o futuro da democracia, a praça pública da velha democracia direta. Agora uma democracia on line.

Sobre as 4 certezas há digressões. A antropóloga Ruth Cardoso afirmou, de modo lúcido que “o povo desunido jamais seria vencido”. Isso parece estar sendo confirmado com as manifestações. Não se têm chefes e líderes a prender ou identificar para esfacelar organizações criadas. O grito das ruas é entrópico. O “inimigo” é um Estado que, assim, não serve mais. Esta “desordem” à qual muitos cobraram “líderes” é uma nova ordem. Isso faz lembrar o filósofo francês Henri Bergson que ensinou que a desordem era apenas “outra” ordem, uma que não corresponde ao nosso uso.

Também caiu por terra a mentira usualmente utilizada pelo Estado de que o modelo burocrático é lento e precisa ser obedecido. Não é. As manifestações causaram eficiências no ritmo. Mudanças rapidificadas. Políticos, por exemplo, ficaram com medo de fazer esse luxo inexplicável que se chama “recesso”. No Senado será um recessinho de pouco mais de 10 dias.

O sabor de vitória para um povo, no aspecto de sua psicologia social, relativamente a um Estado sabidamente relapso em termos de atendimento público como o brasileiro, é o maior anabolizante para os músculos da cidadania. Sem contraindicação. Passa-se a ver um povo mais feliz e batalhador a seu prol. Mais confiante no sentido de que pode alterar o rumo da inércia oficial, da mentira pública, da mordomia nos altos cargos, e da patológica impunidade que, por décadas, protegeu as “autoridades”.

A ideia é de que há uma halo de movimento em expectativa no sentido de que a qualquer momento “as ruas” podem reagir. E com o seu grito o Estado atenderá. O jogo pode ter se invertido. Não é o povo agora que tem medo e está acuado. Começam a ser os responsáveis pelos desmandos acumulados.

Na quarta certeza vem o manejo da internet, detonando ideias sedimentadas, transformando ensinamentos, alterando modelos clássicos de voto, reclamação, insatisfação e mudança. A imediatidade da internet é para amanhã à tarde, não para 2014. Esfacelam-se a “espera”, que dava tempo aos mentirosos de esconderem planos e dinheiro nas calcinhas e cuecas. A “sensatez patrulhada”, que fazia os cínicos vencerem o povo pelo cansaço e pela crença de que contra os governos não adianta nada. A “paquidermia psicológica”, fator altamente nocivo no campo cultural da formação de uma sociedade em que pais e professores ensinavam a resignação aos filhos e alunos como tempero da educação formal. Hoje talvez ensinem que ir para as ruas “resolve”.

Quero ousar chamar isso tudo de “democracia on line” no sentido de um novo modelo. Um que não espere mais pela inverdade do processo burocrático oficial que nunca atendeu à população de modo verdadeiramente satisfatório. Também um modelo que não confie mais nas palavras oficiais fáceis, treinadas para postergar para o nunca. E ainda um que queira operar mudanças efetivas e cabíveis, com lógica, decência e viabilidade em tempos de atender às pessoas mais necessitadas. Há 40 anos que se reclama falta de leitos em hospitais. Falta de água no Nordeste. Falta de boa escola e comida para meninos de rua. Esperaremos mais 40 anos ou mudaremos isso?

É claro que mudanças não se dão só com escritores, intelectuais, sonhadores e um punhado de gente nas ruas. Mas mudanças são feitas com conscientizações. E isso a democracia on line vem causando e ampliando. O espaço na internet é pródigo para movimentos, informações e reivindicações.

De minha parte, concebi o blog OBSERVATÓRIO GERAL e convido você a participar. Queremos manejar informação, jornalismo e entretenimento com crítica. Consegui colaboradores de diversas áreas espalhados pelo Brasil, Eua, Europa e Japão, que atenderam graciosamente ao chamado para produzir. Cada um com seu olhar. Essa sinergia sincera que é a que reúne um povo nas ruas, é a mesma que ajudou a construir o ainda minúsculo OG.

Somos a rua na internet. Somos o grito escrito. Somos a avenida interditada pelo trabalho intelectual de produção, às vezes na madrugada. Do mesmo jeito que as ruas dirão: se não somos uma rica entidade somos as ruas, nós diremos: “Se não somos o Ig, somos o OG“. E assim sonhamos.

Somos Alice Arida, Boris Kierkegaard, Bruno Camolez, Claudia Almada, David Richa, Diana Nacur, Karen Rodrigues, Maria Irene De Conte, Monica Maeda, Rafael Gomes, Roberta de Andrade Simão, Rodrigo Martiniano Tardeli, Wilson Canhas. Mas queremos ser todos os Joãos, as Marias, as Denises, os Eugênios e os brasileiros a nos “curtir” e confiar. Será para eles destilaremos amor em forma de trabalho e contribuição.

A “democracia on line” nasceu. Talvez sem a inauguração formal ou teorizada de um projeto de Blog. Mas o seu poder está exatamente aí. Fático, como ar que se respira. Uma ideologia que se percebe. Há um novo elo entre as pessoas, uma nova esperança. E parece que agora está de verdade nas nossas mãos. Jean Menezes de Aguiar.

Artigo publicado nos jornais O Dia SP e O Anápolis – semana de 17.7.13



Categorias:Cidadania online

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