Enriqueça dormindo

O saudoso Walter Mercado, o Grande Mestre.

O ‘ouvi dizer’ continua imbatível na produção de equívocos e decisões atrapalhadas. Antigamente havia os achólogos ou achistas, profissionais da achologia ou do achismo, uma gente que nunca precisou estudar nada e que apenas achava, opinava sobre qualquer coisa. E tinha certeza sobre tudo.

Modernamente inventaram uma nova especialização: os influênceres e youtúberes, financeiros, jurídicos e quaisquer outros. São operosos rapazes e moças de internet que vendem conselhos e ensinam a tomar decisões. Verdadeiros magos do conhecimento. Sempre têm um nome em inglês para impressionar volúveis e espumosos.

Assim, esses aí aconselham a contratar empregado por meio de PJ, porque isso ‘economiza’ para a empresa, sem saber que o contorcionismo é fraude trabalhista. Aconselham a abrir uma holding familiar para blindar o patrimônio de credores, sem saber que isso também pode ser fraude e até crime. Aconselham a dividir o patrimônio em vida, para não se pagar imposto no inventário, não pensando o quanto se vai gastar em vida. Só rindo. E tantos outros conselhos formidáveis.

No plano financeiro do ‘enriqueça djá’ ou ‘se torne milionário em uma semana’ recomendam mirabolâncias e heterodoxias que só eles conhecem e descobriram, com promessas financeiras sempre muito acima dos rendimentos tradicionais e seguros, a uma óbvia e nada módica ‘taxa’ de administração.

O Direito passou a exigir, com o novo Código Civil de 2002, em toda e qualquer relação jurídica, o fator da boa-fé. Muita gente não se deu conta deste verdadeiro muro de pedra que torna nulo contratos, acordos e relações jurídicas que não estejam certos e formalmente dentro de uma boa-fé não somente subjetiva das partes, mas principalmente a boa-fé objetiva, isso mesmo, uma que sai das cláusulas escritas dos contratos e acordos. Há quem não ligue para isso, achando que seus jeitinhos, malandragens, espertezas e outras más-fés não darão problema. Então tá.

O estudo das nulidades no Direito Civil continua sério e as consequências são severas. A literatura especializada não tem como ‘disfarçar’ safadezas. Ulisses Vieira Moreira Peixoto precisamente na obra Holding Familiar ensina “Assim constituir uma holding para ficar livre de todas as suas dívidas, esconder seu patrimônio, ou seja, uma blindagem patrimonial, poderá configurar fraude civil e crime.” Basta ser alfabetizado para compreender o risco.

Marlos Augusto Melek, juiz do trabalho, comentando as 30 grandes mudanças da CLT em 2017, na Cartilha da Cebrasse, Central Brasileira do Setor de Serviços, ensina com todas as letras: “Empregado tem de ter CTPS assinada. A reforma trabalhista não autorizou ou estimula contratações de MEI ou PJ como empregados. Tem sido bastante altos os valores de condenações na Justiça do Trabalho por situações envolvendo empresas que contratam “MEI” ou “PJ” (pessoa jurídica) como empregado.”

Analistas, especialistas, consultores, palestrantes, gestores, líderes, guerreiros, competidores, vencedores, triunfantes e outras tantas categorias de milionários marquetingueiros, ultravitoriosos e, lógico, felizes, que sempre têm cartilhas pessoais de dicas práticas para ávidos em gastar dinheiro com fórmulas de sucesso e solução rápidos, sempre com lábias e conversas energizantes, impactantes, efervescentes, contagiantes e inovadoras, invariavelmente com muitos termos em inglês, para atender ao pensamento viralatista, continuam surfando na internet muito-bem-obrigado. Mas sempre foi assim em todas as épocas. Gaston Bachelard, há um século, na obra A Formação do Espírito Científico, já mostrava os engodos da pseudociência que nunca saiu de moda.

E o conhecimento segue chato, moroso e cada vez mais restrito a quem se mostra teimoso nele. O problema é que ele ‘vende’, e aí, a causa de tantos facilitadores de cada momento histórico.

Vida longa aos influênceres, os novos cientistas da nova vida youtuberizada.

Jean Menezes de Aguiar.



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