O Supremo Tribunal Federal no caso do Mensalão concebeu um processo “sem recurso”. Chegou-se a ouvir que por ser a Corte não havia necessidade de revisão, afinal não haveria juízes mais “experientes” que os do Supremo. Vê-se que o absurdo tem várias faces. Agora o que há? O STF quer “importantizar” recursos totalmente inofensivos e incapazes de reformar a condenação para dizer que, sim, “houve” recurso no processo.
É o caso dos “embargos de declaração”, um modelo recursal para resolver apenas eventual contradição, obscuridade ou omissão na decisão, sendo que os defeitos devem ser internos na decisão e não “em comparação” com outro caso, análogo que seja. O juiz não pode, por exemplo, afirmar na mesma sentença que a prova é suficiente para a absolvição e na folha seguinte condenar o réu. Isso é contradição. Os embargos de declaração são a modalidade mais “boba” no direito processual. Já houve quem não os considerassem recurso, como o renomado processualista Sérgio Bermudes.
Também entrou em pauta na discussão do Mensalão, o recurso de “embargos infringentes”, utilizado quando há divergência entre juízes de um mesmo órgão, por exemplo a Turma ou Câmara.
Para espanto geral, Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes não querem admitir os recursos no processo. Mesmo sabendo-se que este processo foi ou é “extraordinário”, e tem natureza penal, o que torna tudo muito mais grave. O processo teve “início” no Supremo e não contou com um recurso “plenário”, cheio, como a apelação, o que pode violar a Corte Interamericana de Direitos Humanos (e suscitar reclamação junto a ela).
Não aceitar embargos de declaração, como querem JB e Gilmar, é imaginar que uma decisão judicial possa ser omissa, contraditória ou obscura. A esmagadora maioria da doutrina jurídica reage a isso. Sabe-se que muitos juízes “não gostam” de embargos de declaração, porque por meio deles apontam-se defeitos e vícios numa decisão do magistrado que precisam ser corrigidos. Mas o caso do Mensalão, de novo, é diferente. Por ser penal e por não ter tido um recurso plenário.
Ellen Gracie, ex-ministra do STF, em artigo recente na imprensa diz não ser possível o recurso de embargos infringentes, porque seria um “esforço de obter a impunidade dos réus”. O engano aí é total. Se ministros do próprio STF em revisão recursal “absolvessem” os réus, por exemplo, não poderia Gracie dizer que houve “impunidade”, mas sim “absolvição”, o que é coisa completamente diferente. A menos que se supusesse ter sugerido que os ministros do Supremo iriam se mancomunar em alguma medida para promover “impunidade”, o que parece não ser o caso.
A “implicância” com recursos em processo judicial é visão conservadora e reacionária velha de guerra do direito processual. Pela morosidade do Judiciário quer-se que advogados absorvam a culpa por manejar o que está na lei: recursos. O caos está no forno e vai sair pronto para ser servido. Basta esperar a hora do jantar. OG.
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