É sabida a loucura da maioria dos motoboys em São Paulo. Na Inglaterra há mais de cem deles. Sim, paulistas. O problema é exportado e a reclamação é igual. Falta de educação; falta de inteligência pelo risco enfrentado e caríssimos acidentes e mortes que não cessam.
Toda essa situação conhecida publicamente tem uma característica jurídica grave. Contra eles próprios, ainda que se imagine que muitos não saibam. No direito há um instituto chamado “fato notório”. Está no artigo 334 do Código de Processo Civil. Matéria publicada no jornal O Dia SP, 17.8.2004, intitulada “Motoboys e a presunção de culpa”, de Jean Menezes de Aguiar, já abordava a questão.
O fato notório pode ser entendido como um fato conhecido de forma geral, pelas pessoas que se inserem no mesmo contexto. No caso, os motoristas em geral, de carros, ônibus, táxis e no lugar em que tramita o processo judicial. O fato notório faz com que a situação não precise ser detalhadamente comprovada para se estabelecer a culpa. Qual é o fato notório aqui? O que se percebe no dia a dia da sociedade paulistana em relação a motoqueiros: direção ofensiva, arriscada, de enfrentamento e agressiva. Adianta pouco alguém dizer que “não é bem assim”, essa desculpa genérica. Conclusões estatísticas no final da matéria demonstram o contrário.
Motoqueiros fazem direção ofensiva quando não agem cautelosamente, seja em velocidade, seja querendo criar um corredor que não existe, seja em manobras arriscadas. O conceito de “direção defensiva” para esses motoqueiros é motivo de piada.
Fazem direção arriscada quando assumem a possibilidade de sofrer acidentes sérios com risco de morte. Fica claro que quem se expõe a este risco, não está preocupado com consequências menores. A imprudência na condução das motos é uma prática bastante suicida.
Fazem direção intimidatória de enfrentamento quando se orgulham de se vingar de condutores de automóveis que não se comportam como eles “acham” que devem se comportar. Arranham latarias, quebram retrovisores, quando não dão surras em automóveis, com capacetes, e mesmo em motoristas, aos bandos. Há também as conhecidas bolinhas de gude que motoqueiros carregam em um bolso à mão para jogar para trás, visando a quebrar o para-brisa do veículo que lhes “importuna”.
No mundo jurídico, toda essa imprudência se vira contra o motoqueiro. Se em situações normais a presunção de culpa é do automóvel em relação a pessoas e motos, por ser o automóvel maior e mais pesado, no caso paulistano atual isso se inverte em grande medida. Passa a existir uma especial presunção de culpa em relação a motoqueiros em acidentes urbanos com automóveis, caminhões e ônibus, até que se prove o contrário. Isso é uma inversão jurídica extraordinária, mas se apoia no fato notório em razão da direção ofensiva praticada por motoboys e similares.
Certamente é por isso que as conclusões estatísticas e científicas confirmam o quadro. No site G1 lê-se a manchete “Número de mortes em acidente com moto sobe 263,5% em 10 anos”, junho.2013. No site Vias seguras, há “Motociclistas: mais de 13.000 mortos e 50.000 feridos graves por ano, o maior problema de segurança do trânsito no país”, março.2013.
Já o resumo dos pesquisadores Heloísa Martins e Eduardo Biavati é:
“1. A motocicleta é o principal vetor da violência do trânsito paulistano. Entre 2004 e 2007, as mortes de motociclistas cresceram 46,5%. Em 2008, as motocicletas envolveram-se em 60% dos acidentes com vítimas.
2. Acidentes diurnos, mortes noturnas. O acidente sobre duas rodas acontece por igual a qualquer dia e hora, no período de segunda a sexta-feira, de 7 às 20 horas (73% do total). As mortes concentram-se no período noturno (64% das mortes entre 18 e 6:59 horas).
3. A periferia é o endereço do acidente com motocicletas. 60% das vias mais perigosas para o motociclista concentram-se em vias periféricas. As viagens sobre duas rodas em São Paulo partem das periferias porque é nelas que mora a maior parte tanto dos motociclistas (54,1%) como dos motofretistas (44,8%). Mais de 25% das vias mais perigosas têm característica rodoviária – fluxo de veículos de grande porte e alta velocidade.
4. A conduta de risco do motociclista determina a morte e o acidente. A prática do “corredor”, o avanço do sinal vermelho, a conversão proibida e a contramão são as causas principais (74%) das mortes de motociclistas. A conduta do motociclista leva ao extremo a invisibilidade da motocicleta no trânsito urbano.
5. Motociclistas e Motofretistas são um único personagem social. Os dois grupos residem nas mesmas regiões e apresentam as mesmas características socioeconômicas (sexo, idade, escolaridade, renda). Os motofretistas são apenas 25% dos usuários da motocicleta em São Paulo.”
Enquanto isso, sucessivos governos débeis e politiqueiros não conseguem saídas inteligentes para o problema que inferniza a cidade. Triste realidade brasileira. OG.
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